Curto Desabafo

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Beijo na testa, carinho. Beijo no queixo, vontade...
Como se esquece aquilo que nunca esteve na sua memória? Como se esquece aquilo que ainda não viveu?
Hoje, pensar em ti me fez esquecer porque queria te esquecer.
Em que ponto, ponte, parte, porto ou porta você vive? Nem eu, nem Deus e nem o Diabo sabemos.
Mas você vive em mim.
A contra-gosto, porque não posso sentir seu gosto.

Madrugada Vermelha - Parte 3

17:13 / Postado por Figgis / comentários (0)

Abalado

A garoa sempre fina da metrópole sem nome caía. Caía na grande avenida deserta, caía na pequena rua estranha que a cruzava cheia de bares alternativos e boates underground e caía na porta da Sodoma moderna, o “Le Rouge”.
Os pingos matavam a sede do asfalto calorento, acalorado, que era pisoteado dia e noite e agora se aprazia evaporando os pequenos grãos de água que lhe era proporcionado.
O vento da chuva fazia questão de arrastar por dentre as frestas do Le Rouge essa brisa vaporífera que se misturava ao gelo seco e dançava sensual com os corpos pingantes de suor que se esbaldavam daquele velado ritual de acasalamento.
Homens e mulheres em transe de transa, alinhando verticalmente seus desejos horizontais. Os corpos se tocam, os olhos se engolem, os sorrisos atiram.
Encostado no balcão, Daniel apenas assiste a tudo, com o copo de caipirinha na mão, esperando que o álcool lhe traga a coragem que serve de convite nesse tipo de festa. A outra mão sai do bolso da calça jeans com o celular de última geração e com um toque liga a luz que revela a hora. Duas horas...

- Ei Daniel, vem dançar, desde que começou a namorar fica sempre pelos cantos amuado. Aproveita que hoje a a Rê não tá contigo e vem dançar comigo. - dizia a loira e lesa Lívia, com a mão sobre a dele rebolando o quadril avantajado que Deus e o Diabo lhe deram como arma de conquista.

Deveras a Rê, a Renata, namorada de Daniel não estava lá. E também é verdade que depois do começo do namoro ele vivia pelos cantos. Ambas afirmações tão verdadeiras quanto àquelas que não se diz, como o fato de Renata estar em casa, dormindo abraçada ao ursinho, sem saber que Daniel foi pra balada, ou que consome com o olhar a loira fácil que não desprendeu-se, dele um minuto.
Muita bebida pra pouco homem, ele se levanta torto e ensaia um gingado cuidadoso para que o líquido não lhe fuja do estômago.
Lívia se esfrega, se enrosca no Mauricinho com pinta de Ricardão, o pobre, podre Daniel.
Não, não dá, o álcool não lhe comrpou um ingresso para o ritual de acasalamento, mas a lesa Lívia não se importa:

- Vem, vamos sair daqui, tá muito quente, vamos pra um lugar mais sossegado, Dan.

Dan... iel cala e consente, puxado pelas mãos iria até pro inferno se ela o levasse, e levará...
Trocando risadas com a mesma proporção que trocam as pernas, lá vão Lívia e Daniel rua afora, pela rua estranha até a grande avenida. Encostado na porta do carro, um compacto de última geração, Daniel tenta pensar no que está acontecendo enquanto Lívia o estupra sem sentimentos e com todo consentimento. Beijos, línguas e mãos sob os olhos da garoa que evapora no corpo dos amantes.
Daniel alcança as chaves do carro, imperfeitas condições para dirigir pra qualquer lugar pra ser comido por Lívia, mas há outro homem sob o olhar conivente da chuvinha.

- Aí cuzão, se abrir a boca tú morre, seu viado. Passa as chaves, vai, vai...

Lívia se afasta e cai, tropeçando no meio-fio. Daniel ainda se perguntando cadê a boca que massageia a sua sente as chaves sendo puxadas de sua mão. Ele nem reage.
O homem age. Dois tiros em Daniel, um no peito e outro na garganta.
Dan de olhos abertos vê Lí, melhor amiga de Rê, fugir dali.
O homem arranca o carro da rua na mesma velocidade que arrancou Daniel do mundo.
No chão, a garoa cinza esquenta o corpo do que era Daniel, que está friorento, resfriado... rodeado pelo sangue písado que é da cor do céu daquela noite...

- Rê...

Regras de Uso

17:10 / Postado por Figgis / comentários (0)

Devido a queixas que não foram feitas, nós fomos aptos a identificar dez sintomas comuns ao convívio com tal ser humano. A seguir a lista com indicações de como usa-lo.

1 - Se você acha-lo um doce, espere alguns dias que isso passará. Ele enjoa.
2 - Ele não tem capacidade mental suficiente para ser adestrado. Mas entende comandos simples como: “Senta”; “Rola” ou “Sai da minha frente que eu não te aguento mais”. (Obs.: o mesmo não se aplica a “Finge de morto”. Ainda não conseguimos encontrar o motivo, mas tal comando não é reconhecido pela criatura.)
3 - Existe a possibilidade de se sentir atraído por ele. É uma sensação parecida com a de cutucar uma ferida ou tomar sorvete muito rápido, embora você não goste, não consegue resistir. Para isso não há cura, apenas fique por perto. Como a ferida ou a dor de cabeça, ela passa.
4 - Se acha-lo interessante, mantenha contato. Passado algum tempo, seus conhecimentos cessam e esse sintoma simplesmente se esvai.
5 - Se acha-lo inteligente ou culto, siga os passos da regra 4.
6 - Favor não misturar com líquidos.
7 - Se trata de um ser extremamente inconstante. Não estranhe se ele mudar de atitude de uma hora para outra, ele funciona em ondas cíclicas.
8 - Possui características aderentes e um código genético parasita. Se você sentir que ele está tentando grudar em você, recomendamos um corte cirúrgico em suas funções sociais.
9 - É de suma importância que não o alimente com informações pessoais. Ele costuma regurgitar de forma hostil tais informações sobre você.
10 - E por último mas não mesmo importante. NUNCA! Nunca se apaixone por ele. Testes que vêm sendo realizados há vinte e dois anos revelam que tal prática traz malefícios incuráveis para ambas as partes.

Se mesmo assim os sintomas continuarem, recomendamos um tratamento intensivo que visa induzir uma dose cavalar dos malefícios citados acima. Esse tratamento pode ser um pouco dolorido mas apresenta total eficácia, com garantias de que o paciente será totalmente curado e apresentará repulsa pela substância humanóide referida.
Mas precisamos advertir que embora ainda não se tenham registros de tais casos, é possível que existam pessoas imunes a tudo que já foi citado. Por isso, sejam extremamente cautelosos.

Sem Sanção

00:17 / Postado por Figgis / comentários (0)

As vezes estou de bem com o bem que você me faz,
Rindo, só rindo do bem que o bem me traz.
Constante mente que me traz do ar,
E me traz os ares do que me deixa sem ar.
As vezes te sinto sem sentido,
Me senta sem vestido,
Me sente cem sentidos,
Se sente e senta e cinta,
Sem tidos...
As vezes bem sem você me faz,
Inconstante sede do consentimento,
Com sentimento de um sem tido sem trás.
Sem ar, sem mar, sem vestido,
Sem sanção...
Bem que você me faz bem as vezes.
Paralitica mente que, esporádica, mente.
Pertinente e aparente,
Foge pela frente,
Tempestade e ímpeto
Vá lente...

Madrugada Vermelha - Parte 2

03:24 / Postado por Figgis / comentários (0)

O Velho

A aura avermelhada do céu se mistura com as luzes da cidade em uma fusão mal-feita e ilumina o quarto de Antônio. Junto a luz, a brisa verde caminha gentilmente até a cama onde se encontra o velho e sua esposa, a adorável Sandra.
O vento frágil acha uma fenda na camisa de dormir de Antônio e lhe acaricia a espinha. O arrepio toma-lhe as costas por um todo e em seguida se aloja em sua bexiga, é hora de acordar...
Ele apalpa a mesinha ao lado a procura dos óculos, hoje em dia se levantar sem eles é como se levantar sem os próprios olhos. Ali começa sua longa jornada cotidiana através da madrugada, é a primeira de quatro vezes que irá ao banheiro, sempre nas mesmas horas, a começar por essa que é pontual como a Morte. Uma da manhã.
A urina vai escoando pelo vaso, transformando o que era transparente em amarelo escuro. Antônio com uma mão se apóia na parede, não quer que aconteça como a um mês atrás quando ao cumprir seu martírio diário escorregou no tapete do banheiro e por sorte não quebrou nenhum osso. Pensando bem, esse tipo de acidente estava se tornando cada vez mais comum para ele...
De volta ao quarto, embaixo da coberta apreciando o som do silêncio o guerreiro Antônio pondera:


Olha como dorme calmamente minha doce Sandra, meu anjo... o que será que está sonhando? Talvez esteja sonhando com a noite do baile, todos aqueles vida-boas sentados contemplando-a, mas nenhum deles teve coragem de chama-la para dançar... mas eu tive, eu a convidei e foi comigo que ela dançou...
Ahhh, que dança... que dança! Quando ela encostou a cabeça no meu ombro eu soube, eu tive certeza de que ela seria a mãe dos meus filhos. Minha amada... minha doce Sandra...


Os cabelos brilhando com a luz que invadia aquele momento de privacidade a tornava ainda mais bela. Aos olhos de Antônio ela era a mulher mais linda de todas. Não lhe importava as rugas que tem uma mulher de 74 anos, não ligava se o dourado do cabelo havia se tornado prata e o bronze da pele se enferrujava com o tempo, ela era a perfeição na Terra, Afrodite devia inveja-la de tão linda.
Sandra é tudo que Antônio conhece, vivera apenas 20 anos sem ela, 58 ao seu lado, e mesmo assim se sentia pleno só pelo fato de vê-la dormir...
Novamente a brisa verde entrou no quarto, mas dessa vez forte e severa, fazendo chiar a janela, e junto veio um pensamento terrorista a Antônio:


Será que em meio a esse sono profundo, fantasia como seria a vida se não fosse eu a te convidar no baile? Será que sonha com rapazes da idade dos nossos netos tomando-lhe pela mão e te dando o prazer que meu corpo inerte e cansado já não pode mais proporcionar? Você foi a primeira mulher da minha vida, e foi também a ultima... foi...

O som do silêncio já não agradava mais Antônio, ele olhava em volta, despertando de seu preâmbulo. Sem querer bateu os olhos naquele que sempre vinha tirar-lhe o som do silêncio, querendo ele ou não.

Quando será que você volta de viagem Carlos? Será que já voltou e esqueceu de telefonar avisando? Se ainda estivesse aqui com certeza estaria no computador, trabalhando como sempre e eu poderia ir até seu quarto e mandar você ir dormir. Olha que velho maluco eu sou filho, sinto falta de brigar com você. Acho que quando te ver vou te abraçar, deveria ter feito isso mais vezes quando você era pequeno, não é? Onde será que você está agora? Espero que abrace bastante o Carlinhos, talvez esteja nesse exato momento brigando com ele por estar ouvindo música muito alto... espero que quando tudo estiver silencioso na sua casa, o Carlinhos esteja aí pra te acordar... pode parecer algo ruim, mas é bem melhor do que querer ouvir do seu filho e não saber onde ele está...

Tudo isso por ver aquela foto boba que tiraram quando Carlos era criança e os dois ganharam a competição de pipas do bairro. Antônio segura Carlos no colo com um sorriso com um sorriso contido. Carlos por sua vez está com os braços levantados e a bocona aberta de felicidade. Essa é a imagem da foto...
Hoje Carlos é empresário, tem um filho e uma filha. Débora, a mais nova se forma na faculdade esse ano... nenhum dos dois nunca brincaram de pipa...


Eu fui um bom pai, Sandra? Eu fui um bom marido?
Se eu não abraçava e beijava nosso filho é porque eu sempre quis que ele crescesse forte, preparado para a vida... eu sempre tentei dar o exemplo pra ele. Lembra quando ele cismou que podia me ganhar no braço de ferro? Ele treinou por várias semanas, ficou fazendo flexão, comendo só carne e frutas, lembra disso Sandra? Olha, eu vou te confessar, foi difícil vence-lo, parte de mim queria deixa-lo ganhar, porque ele tinha se esforçado tanto... mas eu tive que abrir mão de alguns prazeres para mostra-lo como é a vida não é mesmo? Tenho certeza que eu ainda posso ganhar dele...


Observando seu braço magro, mais forte que o da maioria dos seus amigos da mesma idade, Antônio se iludiu direitinho, tinha certeza que conseguiria...

Você, em compensação, sempre foi uma mãezona. Sabia a hora de ser dura e a hora de ser carinhosa, sempre esteve lá para advoga-lo quando eu era muito duro... você sempre sabia o que dizer pra me acalmar né? Minha companheira... queria ter estado mais presente, ter lhe dado uma vida melhor... mas você nunca reclamou... sempre esteve do meu lado... com o que será que sonha?

Observando Sandra, ele começou a pensar como seria a vida sem ela, e por um segundo, que Deus o livre, pensou no que aconteceria se ela morresse, ele não conseguiria viver sem ela...

Sandra? Sandra?
Porque Sandra não se mexe? Desde a hora que se levantou ela não virou, não resmungou. Nada... Sandra? Sandra?


Antônio tocou o braço cinza com fios azuis, farrapo de carne... o braço de sua amada.
Sandra ao sentir o toque de seu homem, seu amado, seu Hércules vencedor, instintivamente colocou a mão sobre a dele e abriu um sorriso, ainda dormindo.


É, a vida não acabou para a gente, minha amada imortal... agora se me dá licença, preciso ir ao banheiro novamente...

MiM

05:22 / Postado por Figgis / comentários (0)

Quem sou eu? Eu sou mim...
Eu sou mim, vivo em mim me escondendo do eu.
Desde quando eu tem o comando e eu, mim, perdi a luta? Virei prefeito corrupto de um corpo corrompido, cansado de lutar dou lugar ao eu que espera no falso mundo com desejo de tortura.
Quando menos espero, eu toma conta de mim, me sinto escorrido, extraído da essência, visualizando ações que eu tomo, que eu toma, mero espectador da própria semi-vida, deslocado como uma paulada na retina, escondido no espírito que foge e voa, deixando o recipiente vazio para recepcionar o vazio que é do eu. Que é, doeu.
Mas eu sou eu, parte de mim, ou seria eu, mim, parte do eu.
Não quero ser eu. Eu é monstro frio, andróide andrógeno, criatura da claridade da escuridão.
Quando sou eu, não vejo mim em mim.
Cada dia me torno mais eu e menos mim... não sei se sobrará muito de mim em mim, eu... eu...
Pois mim é fraco, agora sou mais eu!
Mim grita líquido adentro, pede ajuda com sinais de fumaça...
A eterna batalha entre mim e eu... duas forças opostas lutando pela mesma carcaça... todos perdem, eu me enfraqueço enfraquecendo a mim...
Eu quero paz... mim quer paz...
Eu vou embora...
Mim remorre nas cinzas...
Sem mais eu em eu, nem mais mim em mim. Sem mais eu em mim ou mim em eu.
Um recipiente vazio...

Madrugada Vermelha - Parte I

03:02 / Postado por Figgis / comentários (0)

O Menino Pedro

Em um pedaço de terra como qualquer outro, a cena que se vê não é estranha. Várias casas rústicas construídas em volta de uma praça insalubre, onde dormem os cachorros sem dono daquele lugar miserável. Em frente a praça uma igrejinha bege, institucionalizada, apenas mais uma repartição dos escritórios de Deus.
O sino da igreja badala doze vezes, os ponteiros se encontram e olham para o céu escarlate que dá o tom da sinfonia. Meia-noite.

- Pelo que reza, Pedro?

- Rezo para que o dia chegue logo, rezo para que logo pela manhã caia uma garoa agradável, e peço ao papai do céu que me deixe senti-la por alguns segundos. Que ela toque meu rosto, lave meus cabelos e limpe meus pecados.

A brisa púrpura entra por debaixo da porta principal da igreja, varre o longo tapete ecumênico, desvia para a direita, escorre pelos degraus espiralados e adentra o quarto onde está o menino Pedro e Padre Jonas.
No claustrofóbico quarto mal cabem os dois, apertados pelo guarda-roupa com a imagem da Santa e as roupas sacerdotais. O menino Pedro está ajoelhado, com os cotovelos apoiados na cadeira que está encostada à parede. A janela retangular quase tocando o teto ilumina parcamente os vultos do menino Pedro e Padre Jonas.
O padre, com a batina candidamente branca, recosta a mão no ombro do menino Pedro.

- Quando rezamos pro papai do céu, primeiro, temos que agradecer tudo aquilo que ele nos dá. Você tem que agradece-Lo pelo amor que seu pai e sua mãe tem por você, dar graças por eles serem tementes a Deus e permitirem que você venha aqui receber os ensinamentos de Cristo. E sobretudo, tem que agradecer por ter me encontrado, pois nunca vou te deixar seguir o caminho da perdição. Você entende isso, Pedro?

Pedro consente com a cabeça e se vira, olhando com seus olhos de nada os grandes e bondosos olhos azuis de Padre Jonas.

- E outra coisa, Pedro. Se queremos que o papai do céu atenda a nossas preces, temos que cumprir nossas obrigações e fazer tudo que agrada a Deus com bondade e prazer.

A gentil mão de Padre Jonas acaricia o ombro do menino Pedro, uma lágrima ocre escorre pelos olhos do menino Pedro, o menino Pedro está ajoelhado...

O Porquê

04:21 / Postado por Figgis / comentários (0)

O Porquê
Porque você é linda,
Porque não sabe disso,
Porque se esconde,
Porque te achei.

Porque é sensivel,
Porque é sensata,
Porque tem sentido,
Porque estou sentindo.

Porque é carinhosa,
Porque é corajosa,
Porque é carente
Porque faz careta.

Porque, porque porque...
Não sei porque,
Só te sinto e te quero...

Naissance

02:42 / Postado por Figgis / comentários (0)

Eu não nasci para ser existido.
Sou normal, total, quase imparcial,
mas não sou real, original.

Sou coadjuntor, peça base, padrão,
padronizado, parolisado
mas não astro.

Nem astrológico, nem astro físico,
nem astrofísico ou astronauta.
Não sou alto-astral, passional,
muito menos bem legal, radical.

Sou fio do tear
como todos nós,
mas sou fio de centro
não fio de nó.

Resumo, resumo, vou resumir,
tem gente que nasce pra viver
e gente que nasce pra existir.

Passarei.
Há quem não passe jamais..

Futuro do País

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Hoje eu acordei...
Vi uma fiel nação que suportou todas as derrotas, vibraram em todas as vitórias e gritaram: "Eu nunca vou te abandonar!".
Cantavam em unissono o seu hino majestoso, se orgulhavam disso. Toda vez que seus representantes em campo tinham o controle da situação, a felicidade era geral.
Tinham o Gavião tatuado na alma, o que lhes inspirava força, liberdade, vivacidade, e que nunca os deixava desistir de acreditar, mesmo em tempos difíceis não abandonaram suas convicções.
Quando se viram rebaixados, exigiram mudanças! Protestaram, clamaram por algo melhor, expulsaram quase a dentadas os macacos com fantasia de engravatados que geriam seu mundo.
Essa gente não renegava suas origens. Sabiam que era através de seu suor que poderiam ir adiante, clamavam sem nenhum perjúrio "sou malequeiro, sofredor e com muito orgulho".
Tinham garra e disposição, sem nunca desanimar voltaram a elite, alcançaram o topo, o 1º!
Sabiam tudo, viam tudo, nada lhes passava. Na mesa do bar você via pais de família discutindo táticas, técnicas e nomes para que sua nação mantesse sempre um alto padrão de qualidade.
Vestiram a camisa, seguiram de perto todos os passos, lutaram quando foi preciso, apoiaram quando não tinham mais o que fazer e celebraram a justa vitória quando alcançaram um espaço entre os melhores...
Foi então que eu adormeci...
No meu sonho, nada disso tinha acontecido, meu país ainda tinha macacos fantasiados no poder, o povo ainda não se orgulhava de suas origens, mal sabia seu hino... culpavam os poderosos pela miséria e se alienavam em mesas de bar, vendo idiotas jogos de futebol...

Prefiro minha vida desperta...

Ferido Diário

02:47 / Postado por Figgis / comentários (0)

Anotações em meu ferido diário:

Na vida, o homem caminha, não voa. Tão jovem com a minha sigo a boa, a toa, a tola jornada que passa enquanto passo, que passa passo a passo pelos passos curtos.
Perene ilusão que eu tinha do vôo. Perece a ilusão que eu tinha o vôo.
Eu vi tudo ao meu redor, mas o que me rodeava era um quarto de um quarto escuro de portas fechadas e janelas abertas, piscando. Vi favores em vapores, ardências em falências, ameaças em desgraças...
Dei um passo a frente me mantendo no mesmo lugar. Eu não queria caminhar, eu quis voar. Estaria mais perto das nuvens e mais longe do chão.
Não, a vida é andarilha. Anda milha a milha. Trilha o trilho.
Lá do alto vi a todos tão pequenos, via todos tão pequeno. Foi fácil me jogar no alto, não tinha quem me julgasse no ato, estava sozinho.
Eu caí de novo, sou pequeno. Aqui em baixo vejo quem sou eu, sou igual a alguém, sou igual ninguém.
Mas sou vivo filho de um mundo. Sobrevivo filho de um mundo. Acordei, revivi, revi, revisitei, revigorei.
Aqui tenho noções das proporções. Não sou grande, não são os outros pequenos, não sou pequeno, não são os outros grandes... cai por terra mais uma ilusão.
Fim da ilusão de adultecência, sou garotinho, está na hora de trilhar o trilho, tenho muito chão pela frente.
Tenho que caminhar, volto a ti outra hora ferido diário. Tomarei cuidado com as irônias... mas sabes tu que não aprendo nem quando me arrependo. Vou andando...

Sóis da Manhã

16:20 / Postado por Figgis / comentários (0)

Primavera gentil
Prserva em mim os sóis da manhã
A sós na manhã,
E os sóis de amanhã.

Não sou teu, primavera gentil
onde tudo floresce, nasce, cria
Sou do inverno, sem sóis,
Sem sóis, só sós
Mas permita-me sancionar
Sê tu serena com o severo Sol.

Primavera
Preza as plantas, sê tu mãe gentil
Mas não semeie sensações sem sal
Sem som, sem sombra

Primavera do céu e da terra
Sê tu o Sol
Não me nego aos sóis da manhã
Não me negue o luar senil

Primavera, mãe gentil,
Sê tu a primavera, mãe gentil
E deixe que algo sobre em mim até o próximo inverno
Que me sobre lembranças dos sóis da manhã
Porquê sou do inverno, luar senil
E sóis da manhã são só presentes do passado
E mesmo no presente se há passado

Preserve em mim os sóis da manhã,
Mas não me torre
o corpo, a alma e a paciência
Primavera gentil.

Por Um Sonho a Mais. Por Um Sonho Amai

15:00 / Postado por Figgis / comentários (1)

Duas horas da tarde. Metrô Paraíso.
Eu estava pausado ali, estagnado em um dos bancos da estação. Eu me lembro que lia alguma coisa, mas já não lembro o que era... essa estória jaz a anos. Mas tem algo ali que nunca me bandonou. Uma imagem, uma visão.
Para aqueles que conhecem a estação podem ter uma idéia do cenário dessa pequena saga. Na linha verde, dois trilhos separam as pessoas que seguem os sentidos opostos. Do lado de cá, onde estou, segue-se sentido Vila Madalena, do lado de lá, o metrô avança no sereno ritmo caótico de São Paulo até o terminal do Alto do Ipiranga.
Pois bem, lá estava eu, o personagem principal da história de minha vida, descansando por alguns minutos, sentado e lendo. Foi então que ergui os olhos, por um segundo... por um segundo apenas, e lá estava ela.
Do lado de lá da estação, ela terminava de descer as escadas que dão acesso a linha do trem. Lembro-me até hoje, como se fosse uma foto, a palma da mão acariciando de leve seu pescoço e os dedos tocavando-lhe os cabelos cacheados, castanhos, que dançavam até as costas.
Não, não era uma mulher, era uma deusa, um anjo! Não existem palavras suficientes no mundo para descreve-la aqui, por isso nem vou tentar, seria um insulto encaixar tamanha beleza em tão poucas palavras, nem meu vocábulário inteiro de adjetivos a detalharia com exatidão, então me abstenho de mais descrições e os deixo com apenas uma palavra... um anjo!
Eu nunca vou entender o que foi que senti por aquela garota. Não foi amor, por favor, não imaginem aqui uma história linda de amores a primeira vista. Muito menos tesão, novamente peço, não menosprezem todos os sentimentos que corriam por mim quando a vi como algo controlado por uma parte tão egoísta de mim.
Era algo diferente de tudo, aqueles segundos foram cravados na minha memória e talhados na minha alma de uma forma que eu nunca vou entender. Tive que fazer um enorme esforço para que o livro, aquele fino livro, não caísse da minha mão.
Foi naquele momento que entendi as cenas dos filmes, onde tudo fica mudo(ou será que era eu que tinha ficado surdo?) e onde o mundo para por alguns instantes, para que algo maior por ali passasse.
Ela se aproximou calmamente dos trilhos. Eu juro que tentava não olhar, tentei fingir que nada de mais estava acontecendo, mas o que estava acontecendo era demais!
Mas como eu não estava em um filme, e sim na metrópole que não para, nem mesmo para respeitar os sentimentos puros de um tolo, o barulho da minhoca de metal que se aproximava da estação tirou qualquer pensamento (ou a falta dele) que eu pudesse estar tendo no momento. Era o meu... era o meu metrô que chegava, Vila Madalena. Fechei o livro e entrei, mas quase não consegui entrar antes que a porta se fechasse, e como castigo de algo imperdoável na cidade grande, por me demorar já não tinha mais lugares para sentar.
Mas foi aí, meus amigos, foi aí que algo maior aconteceu, algo mágico, algo que nada nem ninguem vai me tirar. Ela olhou pra mim! Sim, juro, aqueles olhos de ternura olharam diretamente para os meus, e fez o que só as mulheres conseguem fazer, olhou através dos meus olhos para dentro de mim e pôde analisar as intenções que tinha com ela. E ela lendo em mim tudo aquilo que eu não sabia o que era, me deu o sorriso mais lindo que já vi em toda a vida.
As más línguas poderiam dizer que dentro naquele vagão tinham dezenas, centenas de pessoas, e que as chances de ter sido para mim que ela olhou eram ínfimas, ou que ela estava a rir de mim, e não comigo, já que naquele instante, enquanto eu a observava, minha cara estava mais abobalhada do que já costuma ser. Mas eu peço que as más línguas, por favor, não digam nada, deixem-me apenas guardar aquele sorriso.
Eu sei que era para mim que ela olhava, eu sentia isso. E foi dessa forma, trocando olhares numa estação de metrô enquanto o trem me arrastava consigo para longe dela, que minha história teve começo e fim.

Eu sonhei com ela essa noite, acreditam. Faz um ano, dois anos que a vi, mas eu sonhei com ela sorrindo pra mim essa noite. Ela estava com a mesma roupa, o mesmo sorriso, a mesma idade...
Quando aprendemos a observar os detalhes do mundo, aprendemos tambem a observar a beleza nas pessoas que vivem nele. Aquela garota nem sabe que eu existo, eu por outro lado não consigo esquecer que ela faz parte do universo, iluminando e melhorando as coisas ao seu redor.
Ou talvez não, e aí reside a beleza nesse encontro casual. Eu nunca vou saber quem ela é, não tive tempo para julga-la, como fazemos com todos que estão ao nosso lado. Já tive grandes amores e descobri que os amores residem no tempo, no conhecimento, nos pequenos detalhes. Eu não tive amor por ela, eu nem a conheci, não conheci seus pequenos detalhes. Ela pereceu na minha existência antes que qualquer defeito fosse aparentado, e por causa disso viverá para sempre em qualidades. A perfeição só existe assim, na ilusão... mas quem disse que a ilusão não faz bem de vez em quando?
Volta e meia eu me pego imaginando como seria se eu tivesse feito alguma coisa. Me pego revisitando aquele momento e imagino o que teria acontecido se eu tivesse insistido, se não tivesse entrado no trem, e sim dado a volta para alcança-la, trocado algumas palavras, gritado amor incontido para ela no meio do metrô.
Mas não, não era assim que tinha que ser, agora ela existe aqui dentro para sempre, aquela experiência ilusória foi tão real para mim que qualquer toque de realidade a cena seria uma ilusão.
Ela não foi a primeira, não foi a única que passou por segundos na minha vida e deixou sua marca. Poderia escrever-lhes um livro narrando todas as pequenas estórias que trago comigo sobre encontros casuais, pessoas que vi uma vez, e que me marcaram tanto quanto pessoas que caminham ao meu lado a vida toda, mas a menina do metrô já ilustra bem esse ponto.Para encerrar, queria propôr a vocês que façam o mesmo, olhem ao redor, dêem valor as pequenas coisas e principalmente às grandes pessoas que tiveram pequenas passagens em suas vidas. E pensem também que, como aconteceu comigo e com o meu anjo, talvez nesse exato momento tenha alguem sonhando com vocês, pensando em vós, pessoas que nem mesmo sabemos que existe... pensem nisso...
Esse texto vai dedicado para alguns desses anjos que tiveram pequenas participações na minha vida, e que por obra do destino, mesmo tendo tudo para continuar lá, seguiram caminhos opostos... as que cito aqui eu só vi por um dia, mas volta e meia ainda lembro delas, e isso me faz bem, gostaria que fosse diferente, mas não foi... e hoje são ternas lembranças... nem ao menos sabem que tem alguem lhes dedicando textos...

Para Karin, que me deve um beijo... para Fernanda, que me deve um filme... para Andréia, que me deve um segundo encontro... e para Ela, a menina do metrô, que não me deve nada.... mas para quem, em compensação, eu devo tanto...

Quem cala consente

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Porque quem cala é a corrente
Porque quem cala é a corrente

E o que se cala se sente
E se a moeda é corrente,
Então o cara consente
Mas se a gente fala, é a corrente
Porque quem cala consente

Porque a tristeza é decente
Porque a vida é carente
Porque a voz é ausente
Porque quem fala é indigente...

Porque quem cala é a corrente
Porque quem cala é a corrente

E na tristeza da gente
Então o cara é patente
Então a vida é ausente
E quem se cala é patente
E o que se cala consente...
E o que se cala consente...

Porque quem cala é corrente
Porque quem cala consente
Porque quem cala é patente
Porque quem cala... é corrente!

Prólogo

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“Me enterre quando eu for? Me ensine enquanto eu estiver aqui?
Quando chegar a hora de pertencer, será a hora que eu desaparecerei (...)”
James Hetfield / Lars Ulrich


São três horas da manhã. Deitado em uma planície, em alguma parte do mundo, um homem observa as estrelas. Olha para o negro céu pontilhado de amarelo enquanto uma leve brisa acaricia seu corpo.
Este homem passou sua vida inteira tentando compreender o sentido da vida, o sentido de estar ali naquele momento e naquele lugar. O que será que o levou até ali? No percurso de sua vida, tomou várias decisões, escolheu vários caminhos que considerou melhor e essa jornada o levou a ser o homem que era.
Mas será que ele teria como escolher outro percurso? Ou como em um programa de computador, uma equação matemática, todas as decisões que tomou eram apenas as somas de fatores genéticos combinados com as condições que a vida lhe impôs?
Ele encontrou várias perguntas sem resposta em seu caminho, para algumas conseguiu achar respostas satisfatórias. Para outras, ele acreditava que com o tempo as encontraria, e para tantas outras as respostas que achou pelo caminho, com o decorrer do tempo, percebeu que não eram tão corretas como ele imaginava, e então teve a humildade de abandona-las e recomeçar do princípio.
Algumas vezes, encontrou-se em situações difíceis e precisou enfrentar seus inimigos. Em outras ocasiões, ele foi inimigo de si mesmo, e em algumas batalhas venceu, em outras perdeu.
No fim das contas, ele só tinha uma certeza, assim como ele nasceu um dia e vivia aquele momento, ia chegar a hora em que tudo aquilo ia cessar, e tivesse ou não as respostas, ele iria morrer, e embora não soubesse quando ou como isso ia acontecer, ele sabia que tudo tinha um começo, um meio e um fim.
O dia já ia clareando e então nosso amigo resolveu voltar para casa, se levantou mesmo sem ter encontrado o sentido da vida e caminhou na direção do horizonte. Momentos depois, sem nem ao menos perceber, caiu ajoelhado sobre a grama rasa, e sentindo seu coração parar aos poucos, a falta de oxigênio e a circulação de sangue cessando lentamente, pode perceber que sua hora tinha chegado. O homem morreu ali, sem conhecer as respostas para suas dúvidas, sem saber o que aconteceria a seguir, sem nem ao menos saber que aquele era seu momento. Ele morreu.
Tudo tem um começo meio e fim, não nos damos conta quando tudo começa, seguimos nossos caminhos durante o meio, e sem que nos percebamos, chega nosso fim. Esse é o destino de todos os homens. Um dia morreremos como morreu o homem da planície.
Não apenas como pessoas, mas como a civilização em geral, podemos ter certeza de uma coisa, assim como nascemos e morremos, alguém antes de nós já esteve aqui, e alguem depois de nós ocupará nosso lugar.
E é exatamente sobre isso que nossa história tratará. E é exatamente isso que Daniel vai descobrir bem antes do que ele imagina...

Quem Tem Medo do Escuro?

23:27 / Postado por Figgis / comentários (0)

Em meio a tarde quente me encontrei nas trevas e pela primeira vez tive medo do escuro. Senti o escuro e nada a minha volta era paupável. Tudo se perdera em questão de segundos, em uma tarde fria e fria.... fria e fria era tudo escuro.
Quem tem medo do escuro? Os medos de infância são piores quando somos adultos, somos culpados por ter medo e por sermos infantis.... somos culpados de tudo.
Da minha infância foi-se a inocência, sobrou os medos, quando tudo estava apagado eu me senti desamparado e só contava comigo mesmo.... queria poder contar com alguém mais confiável...
Eu tenho medo do escuro, você já se sentiu no escuro? É horrível se sentir..... é horrível se sentir... no escuro perdemos um sentido e aguçamos os outros, e numa vida sem inocência, sentir por si só já é horrível... sentir-se só é horrível... e sentir-se é horrível.
No meio de uma tarde fria e fria as sombras tomaram contornos e os ruídos se tornaram ameaças. No escuro metafórico estive eufórico e me vi sozinho com a minha consciência.... essa sim me assusta.
Meus medos infantis se revelaram tão reais que tenho medo de pensar.... o medo do escuro de uma criança num quarto se transformou no medo do escuro de um homem perdido, o medo da altura de um menino que chorava do topo do desfiladeiro se moldou e hoje não sei se devo pular.... o medo de fantasmas, esses sim continuaram intactos, eles vivem mortos bem perto de mim, bem dentro de mim.... vivem mortos na minha consciencia, essa sim me assusta.A tarde vai caindo, ainda está frio, e ela ainda é fria, quando virar noite, virá a noite e tornará tudo mais escuro? Espero que não, quero uma brecha na porta, uma luz que me console, quero me sentir bem nem que seja da luz que vem lá de fora, lá de longe..... por favor, luz, não se apague....Quando eu era pequeno não tinha medo do monstro do armário, hoje meu armário se encontra tão cheio de esqueletos que já não tenho dúvidas, eles virão atrás de mim! Mas quando era pequeno tinha inocência, mas já não sou inocente, provei o contrário, e tenho o maior medo que um adulto pode ter.... responder pelos meus atos.... quem dera nessa hora voltasse a ser criança...
Quem tem medo do escuro? Quando todas as luzes se apagarem, o que vai restar é o que você é. E não gosto de ficar sozinho comigo..... tenho medo de monstros...

Palavras Desconexas

00:26 / Postado por Figgis / comentários (0)

No meio das sombras noturnas de um passado pueril encontrei uma sombra viva em um estado febril. Estado de consciência inconsciente da beleza, tristeza e de toda a morbidez exacerbada. Hoje é dia, é noite, é tudo escuro. Tudo flui da sombra do cigarro, da luz da chama acesa... Frio da noite é um conceito interessante, palavras incoesas e sentimentos inconstantes.
Jogue a força pela janela e concentre-se na luz que vem de fora, pra que nada dentro gere tanta confusão mas gera tanta solução de um sentimento estriado.
Ontem eu via uma sombra que se transformou em híbridos gritos de melancolia despercebida. Toda a consistência de algo indelével se joga contra você quando tenta lutar...
Hoje é um novo dia, e de hojes e ontens se faz o amanhã. Se amanhã vai fazer Sol ou vai chover, não sei. Que a Lua me indique mais um caminho para percorrer. Em cima de uma moto, com o vento no rosto.... todas as pessoas passam rápido... em cima de uma moto todas as pesoas passam rápido.
Mais que demais é tudo que temos e se nem hoje nem amanhã poderemos ter, que tenhamos o ontem, brindemos a sabedoria dos loucos e pulemos grades em direção ao manicômio, morada final.
Risos soltos na frigidez de um intante se dissipa como a sombra do meu cigarro, e a chama que continua acesa chama a chama que continua acesa, chame a sexta chama e não veja forma em fundos. Intenção é viver, extensão é te ver, de ver, de ter e te ter pra que? Vai saber...
Loucura é só um modo de se ver, e tristeza é só um conceito relativo. E que todas as dores me tragam novas fortalezas e abandonem os navios das esperanças, a luz que brilha no horizonte não mais te olha e nem sorri. Tudo é cinza e sombra, todas as tonalidades refletidas em galões de percepção te enganam e me sofrem, e me sofrem um ataque cardíaco do veneno do cigarro e da chama acesa.
Ascende os olhos ao benigno e transcende a intensão de votos. E que rápido siga uma vontade incoersiva de viver grunhindo as maravilhas do subnível. Gente que é gente nunca perde a podridão, que a beleza jorra de fundos falsos transforme sua beleza em alma e crie palavras desconexas... palavras desconexas.... fundos falsos, forma e fundo sem razão para viver, a sombra de um cigarro aceso, palavras desconexas.

Linhas Tortas/Não Ter

01:02 / Postado por Figgis / comentários (0)

(Esses dois textos que coloco nessa postagem não foram escritos por mim, e sim por um grande amigo, Renato, que vem aprendendo com o tempo a exorcizar seus demônios através das palavras, e assim fazendo tem criado belos manuscritos, como os dois que coloco aqui, um abraço Renato.)


Linhas Tortas


Se por um acaso escrevo em linhas tortas, é porque a reta não mais me interessa, seguir reto seria o caminho mais medíocre do qual, pessoas mais certas apenas sentem o dispensável prazer de ser dispensado.
Amar leva a pessoa à loucura, tentar apenas um sentimento da distância, de alguém que faz seu coração suspirar por um beijo na testa, demonstrando respeito, um beijo no rosto dizendo: nossa amizade é eterna, um selinho demonstrando paixão, e finalmente o ardente beijo em chamas, demonstrando um mar de rosas, O DESEJO.
Sentir é saber que estamos vivos, mais a vida nos mostra que infelicidade faz a maior parte de nossas vidas, nos provando que somos seres humanos e que temos coração, é a maior prova de nossa existência, só ainda não me provaram que estou vivo por uma boa causa.
Sentir o coração bater. Ah o coração! É quase dizer que ama a si próprio, é sentir o calor do próprio corpo, é suspirar, é ser feliz, ou estar perto de alguém, a quem tem um forte desejo de relação, não importa a qual. O coração com fortes batidas, é estar nervoso, é sentir vontade, é querer, e não ter.



Não Ter



Perdi alguém da qual eu amo muito, do qual sinto desejos, do qual penso a todo instante, a cada segundo, não há distração, não a tempo que me deixe esquecer nem sequer um segundo. Perder é fechar um livro do qual eu comecei uma história, sem querer parar nesse fim tão inesperado, sem querer fechar tal livro e deixar empoeirando em um canto qualquer, em alguma estante velha, um criado do qual não se usa mais, no porão, onde tudo é escuro e medonho, não importa onde, mas em qualquer lugar a poeira vai cobrir aquele livro, da cor da paixão, e com o tempo se torna negro, sendo coberto por pó marrom. Difícil é viver sem ter terminado com um final, um final do qual daria tudo para que fosse feliz, um final, do qual me mostre a verdadeira felicidade, amar, querer tal felicidade, ter a pessoa da qual entrego minha vida, meu coração, minha mente, minhas palavras.
Oh! Minhas palavras. É a forma da qual encontro para chorar, já que em meus olhos não se tem mais lágrimas, e já que a pessoa amada e não minha, as libertou para que elas pudessem voar. Eu gostaria que apenas a tinta de minha caneta esgotasse, daí seria apenas um tempo até eu reabastecer, e continuar tal história, tal romance, tal perdição carnal, tal liberdade de seguir em frente, num corpo quente, do qual eu tanto quero.
Eu gostaria sim de não estar escrevendo tais palavras, gostaria de deixá-las presa já que o contrário disso tudo, seria eu ter minha amada em meus braços.
Dizem que o amor é bobo. Não, o amor é uma doença da qual quando acostumados a perder nesse aspecto, sem ao menos estar sentindo, sabes que sem tal sentimento, a vida não faz sentido, que o legal, é carregar tal peso no coração, estar apaixonado, para que possa contar os dias, para que possa contar as horas, para que chegue o tão esperado momento de olhar no fundo daqueles olhos novamente, de sentir-se protegido de qualquer mal que venha acontecer, sentir que a maior proteção é ter aquela pessoa, aquela da qual você nunca esqueceu, nem segundos nem minutos, nem no almoço, nem ao som de uma música, nem quando passear com o cachorro, ou lavar o carro, nem assistindo aos filmes, que às vezes mostram cenas, ou dizem palavras que lhe faz sentir falta, falar com um amigo, fazer coisas, pequenas coisas que possa se transformar em grandes alegrias.
A vida não tem sentido sem a pessoa da qual amo, mas a pessoa que amo, eu não tenho, no entanto tento, por mais que luto, por mais que eu queira, nada eu vou ter.
Vida, oh vida, fria, injusta, sem nexo.


Renato Kubrusly.
02/09/2008

Uma Espada e Sem Espelhos

00:58 / Postado por Figgis / comentários (0)

Guerreiros são aqueles que vão a luta e sábios são aqueles que apenas sentam e conversam a respeito.
Não tenho alma para ser guerreiro e nem a paciência pra ser um sábio. Não que não tenha alma de guerreiro, não tenho alma de nenhum jeito, tudo que tenho é medo e receio, abraço meu medo, acato meu receio. Não que paciente eu não seja, mas ficar sentado enquanto moinhos de vento tomam conta dos meus paraísos de ilusão... isso não.
Talvez eu encontre um meio termo, um ponto de equilíbrio, mas desequilibrado do jeito que sou, estou sempre pendendo à esquerda, tudo que tenho é uma espada para enfretar meus demônios na guerra que eu travei para mim. Minha guerra, minhas regras, mas ainda tenho medo, não dou passos a frente nem para trás, e nem assim fico parado onde estou... onde estou?
Nos vultos e sombras que eu cansei de lutar vi alguém, algo, alguma coisa, alguma pessoa... algo ou alguém, ainda não sei, só sei que pendia à direita, e cansada de se ver no espelho, virou para trás e viu algo, alguém, alguma coisa... viu a mim... mas o que sou eu?
Eu só tinha uma espada, ela só tinha um espelho, eu pendia à esquerda e ela à direita e ela não era direita e eu não era de esquerda. Um mais um igual a um, ela pendia à direita e disse que não gostava do que via no espelho, então quebrei o espelho... somos dois mais uma espada e sem espelhos.
Não somos guerreiros, nós temos medo... não somos sábios, não temos paciência, mas sem dar um passo a frente nem para trás, estamos indo a um lugar que não estávamos antes... onde estamos?
Uma espada e sem espelhos, se espelhando um no outro, só temos a espada, e mesmo que apareçam cem espelhos, temos uma espada e temos um ao outro... mas afinal, o que temos?
Dois contra o mundo? Pior pra ele, ele está em desvantagem numérica... dois contra o mundo? mas não somos guerreiros, se estamos juntos e enfrentando o mundo, foi porque ele começou e não temos paciência para espera-lo, disfarçado de moinho de vento, se acalmar...
Decifra-me ou devoro-te? Espero que ambos... agora estamos em equílibrio, com uma espada, e sem espelhos.

Obi

00:51 / Postado por Figgis / comentários (1)

Obi era forte e destemido, mas também era pequeno e risonho. Não ligava para as coisas desse nosso mundo de adulto, como dinheiro ou trabalho, se os tinha, usava para viver feliz, e se não tinha, vivia feliz mesmo assim.
Quando eu era ainda mais criança do que sou hoje, Obi veio me visitar pela primeira vez, inocente e feliz. Ele era todo fofinho, o pelo tão branquinho que mais parecia um floco de neve. Passou a patinha na minha face, enxugou minha lágrima e me perguntou com um sorriso cativante:
-Porque está chorando? Não fique triste - dizia ele - venha brincar, vamos brincar de pega-pega, porque não adianta nada ficar aí no canto chorando, tem que se distrair para esquecer seus problemas.
E assim foi, brincamos por dias sem parar, ele era meu melhor amigo, ele nunca ficava triste, sempre inventava algo novo para a gente se divertir.
Meus pais achavam que era só um amiguinho imaginário, mas não, não era, Obi era real, era a coisa mais real que eu tinha. As vezes ele ia embora e ficava dias sem aparecer, e então eu ficava triste de novo, mas ele voltava, e dizia que mesmo quando eu achava que ele não estava ali, ele estava... ele sempre esteve presente, eu é que por vezes não vi.
Obi me disse que vivia numa terra mágica que ficava escondida no Pólo Norte, e que lá viviam vários ursinhos que nem ele. Dizia que lá era dia por seis meses e noite nos outros seis, e que quando era dia, tudo ficava tão quente que o calor era quase insuportável, e nos "dias de noite" era tão frio, mas tão frio, que ele e os outros nem saíam pra brincar, ficavam escondidinhos na sua toca, hibernando.
Os dias passam e com eles passa-se o tempo, passam-se os anos. Em minha juventude, Obi continuou a me visitar, eu estava crescendo e ele também, meus pais achavam estranho um garoto da minha idade brincando com meu amigo imaginário, mas nada diziam... fazer o que, essas coisas da mente são assim.
Quando ele estava por perto, os dias eram alegres e tudo a minha volta tinha vida, mas quando ele ia embora eu sentia tanta saudade que nada ao meu redor parecia fazer sentido. Será que é noite lá no Pólo Norte também? Será que Obi está hibernando?
Meu ursinho Obi... meu ursinho Obi... o tempo passou e hoje sou adulto, não posso mais abraçar Obi, às vezes vejo ele de longe, acenando para mim, pedindo que eu vá lá brincar com ele, mas não posso, embora tudo fique feliz quando estamos perto, ele sempre vai embora, e tudo sempre fica frio... gelado, acho que se continuassemos a brincar, eu acabaria me mudando para seu mundo mágico, e não sei se aguentaria o calor, nem o frio... é melhor ficar no mundo real, onde tudo parece fazer mais sentido, não estou feliz, não estou triste... como será que está Obi? Será que um dia ele vai acordar de seu hibernamento e me abraçar de novo?

Boa Noite Dorival

04:27 / Postado por Figgis / comentários (0)

Não gosto de samba, não gosto do Rio, não gosto da Bahia... mas gostava de ti Dorival.
Morreste jovem, aos 94 anos... nem completou os 100.000 anos que todo o gênio deveria completar...
Pois era isso que era Dorival, um gênio, um mestre, quando mais jovem que eu, era maior do que todos, compôs músicas sobre sua terra, que insisto, não gosto, não tenho adendo, mas veio mar adentro pela minha alma e mostrou a beleza em ser baiano.
Mostrou a beleza em ser brasileiro, criou versos que nunca vi alguém criar, criou vida numa terra cheia de vida, criou vida na Terra exultando o mar...

Não tenho palavras para descrever o que deixou, então uso suas palavras para descrever o que sobra depois de você, Dorival:


"(...)ai, se eu escutasse hoje não sofria
ai, esta saudade dentro do meu peito
ai, se ter saudade é ter algum defeito
eu, pelo menos, mereço o direito (...)"


Dizia que sentia saudade de sua terra... que saudade da Bahia... mas eu não sinto saudade da sua terra, mas sinto saudade de ti, diziam que você era preguiçoso, e sem esforço virou o estereótipo do músico baiano folgado... mas sem esforço compôs lindas melodias, exultou o oceano e casou-se com a Estrela Do Mar, quando foi morar no Rio de Janeiro, você e Stella Maris formaram um belo casal, viveram juntos e... que saudade da Bahia não é Dorival?


"O pescador tem dois amor
Um bem na terra, um bem no mar
O bem de terra é aquela que fica
Na beira da praia quando a gente sai
O bem de terra é aquela que chora(...)"


Gostava de ti Dorival, porque se foi, o mundo precisava de mais um pouco da sua calma... o bem da terra somos nós, que choramos por você, estava cansado, meu caro amigo? Estava cansado de sofrer por amor? Você não morreu Dorival, você foi pro mar, o corpo de homem já não te agüentava mais... foi beijar Iemanjá, cansou por esperar Stella ficar melhor? Ela entrou em coma 10 dias antes de você morrer... e você Dorival, como o último romântico, morreu por amor... e ela, Dorival, como a última romântica, foi logo em seguida, de cada olho cai uma lágrima, uma por você e uma por Stella... ela foi descansar no céu com seu doce acalanto.


"É tão tarde
A manhã já vem
Todos dormem
À noite também
Só eu velo
Por você, meu bem
Dorme anjo(...)"


Seu anjo foi para o céu, e lá está também você, descansem os dois eternamente, deixe que nós aqui cuidemos do resto... viveramos sem você, seu corpo acabou, mas seu legado ficará, por bem mais que 100.000 anos... vai fazer companhia ao teu amigo, dê um abraço no Amado por mim, pois encerrarei meus lamúrios com a música que vocês dois fizeram, mas antes disso só queria dizer mais uma coisa, Dorival, quando você se foi pensei: "Dorival morreu, antes ficasse ele e fosse eu". Boa noite Dorival... durma bem aí no mar...


"É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
Saveiro partiu de noite foi
Madrugada não voltou
O marinheiro bonito sereia do mar levou
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar
Nas ondas verdes do mar meu bem
Ele se foi afogar
Fez sua cama de novo no colo de Iemanjá
É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar meu bem
É doce morrer no mar"

Acerca das Ilusões

18:25 / Postado por Figgis / comentários (0)

Redemoinhos de areia, sugando tudo que existe. Sentei na vida, construindo castelos de cartas. Reneguei a lei, sei que o que não sei nunca saberei. Não sei quem sou nem o que sou, mas sei onde estou e o que serei, sei que da lei do Rei não serei, farei com que tudo que dei volte e terei, tudo que quero de uma só vez.
Redemoinhos de imagens, cuspindo tudo que esquecia. Sentei em meu castelo de cartas e construi vida. Abracei a lei, sei que o que não sei saberei. Sei quem sou e onde estou, mas não sei para onde vou, e o que serei? Rei de mim, darei tudo que tenho e que nada volte para mim...
Os sonhos me parecem reais, as pontes, ilusões de estrada, o que toco não sinto e o que sinto não é nada, quisera ter respostas para as perguntas erradas, quisera, quem dera... saber qual é errada... lucidez surreal ou esquizofrênia programada.
Quimera? que nada, se me espera sentada não pode se preocupar. Se corro morre, se fico foge, se espero: "não quero"... pois eu vou, adeus.... pois eu vou a Deus...Quem era? Ninguem, ninguem que se preocupou. Algumas lágrimas sinceras, algumas páginas se encerram, e o caminho continuou.
Quão funda é a toca do coelho? Quão funda é a toca do coelho?

Musa Inspiradora

18:24 / Postado por Figgis / comentários (0)

Minha musa é inspiradora.
Se eu fosse pintor, pintaria o céu como seu chão, todo o mundo invejaria a minha bela inspiração. Teria cores de açucena, que o homem nunca viu, e eu usaria todas elas, para pintar seus olhos vis. Formas e fundos divinais, para pintar o seu sorriso, e as curvas do diabo, para delinear seu corpo liso... minha musa, musa minha, toda a vida em vida tinha.Minha musa não é mulher, minha musa já é deusa.
Se eu fosse cineasta, toda a luz viria dela, sem maquiagem nem efeitos, só seu lindo rosto em tela. Se ela fosse a estrela, não precisaria iluminação, nem ataque ou contra-luz, nem tampouco compensação. Se a história fosse dela, um romance ela seria, se a história fosse minha, aí um drama eu faria. Se a história fosse nossa, eu faria uma comédia... mas se a história fosse ela, aí então seria épica! Marcaria toda a época, mas só eu iria ver.
Minha deusa musa linda é Truffaut com Monalisa.
Se eu fosse esculpi-la, de diamante ela seria, a faria sete anos, e só então conluiria. E no topo mais alto, colocaria o monumento, que fiz por sete anos, usando as unhas como instrumento.
Se eu fosse pianista, mil sonetos comporia, mil operetas, mil melodias, e uma linda sinfônia.Minha musa é toda minha, é só minha, é minha musa. Alma harmônica, corpo de diamante, olhos vis com toda a vida, minha musa inspira tudo, ela é minha, minha musa.
Minha musa não me usa, e se usa não abusa, e se usa e se abusa, inspira a dor inspiradora. Se fosse pintor, cineasta ou escultor, ou até mesmo pianista, faria juz a minha musa, a minha musa tudo faria. Mas não posso nada, sou escritor, e se vejo ela parada, não pinto, não toco... ela me deixa sem palavras...

Snuff

16:31 / Postado por Figgis / comentários (1)

(inspirado em uma inspiração real, respirado em "Snuff", nova música do grupo musical Slipknot, suspirado em uma personagem fictícia...)

Já era tarde da noite, mais uma madrugada sufocante, dentro do apartamento as sombras se fundiam com a imagem daquele homem, sentado numa velha poltrona bege, com a cabeça baixa, o rosto escondido em meio aos cabelos longos que caiam no seu rosto e tudo que era visível no ambiente era a fumaça do cigarro que flutuava lentamente, carregando seus demônios para longe, já era tarde e estava cansado.
Não tinha nome, não precisava de um, era apenas mais uma sombra do quarto, mais uma imagem no mundo que só existe como forma de uma luz que não resplandia em si. Calças amassadas, camiseta preta... era só um homem e um cigarro, olhando para a penteadeira a sua frente. Um telefone, várias cartas... uma penteadeira.
A chuva forte que caía lá fora inibia o som dos seus pensamentos, flashbacks delirantes, ouvia sua voz em um passado que parecia tão longe, que já não existia mais... no passado. O dia que perdeu sua alma, o resto de alma que tinha, já não conseguia lembrar o que era real e o que era sua imaginação sádica... ouviu sua própria voz, falando calmo com o vulto de esperanças - "Enterre seus segredos em minha pele" - o rosto que toda noite o atormentava já era uma imagem desfigurada que o inconsciente fez questão de deturpar - "Leve embora sua inocência e me deixe os pecados...". Mártir de sua própria existência... já era tarde e estava cansado.
Tragada sufocante, absorvera todo o veneno que sentia necessidade de inalar. Não sabia se era viciado na nicotina, no veneno do rato ou na dependência de algo em suas mãos, e não ligava de morrer aos poucos... a fumaça a sua volta representava a jaula que o mantinha preso, animal sem alma e sem destino. Cerrou o punho e bateu contra o braço da poltrona, apertava a mandíbula uma contra a outra e se levantava, indo até a janela... não entendia seus sentimentos, o amor era só mais uma camuflagem para o ódio, que voltava subitamente.

Um trovão! O som do trovão! Mais uma madrugada sufocante disfarçada de noite comum, já tinha tido uma dessas, pensava no telefone que tocou poucos minutos antes, ouvindo a voz da flor da inocência -"Quero ver-te novamente" E toda a dor vindo a tona.

Um trovão! O som do trovão! Perdido no meio da chuva, a água escorrendo no seu rosto. Quantos anos atrás não se sabe... um doce beijo.... uma doce raiva... a dor ainda era uma brincadeira, era uma madrugada chuvosa disfarçada de noite comum, e não sabia que seu crime teria tal castigo:
-"Então, se me ama, deixe-me ir! E vá embora antes que eu perceba!"
O silêncio do outro lado... o silêncio da compaixão
-"Meu coração é sombrio demais para que se importe." - continuara -"Não poderei destruir o que não existe!"
Mártir de si mesmo, melhor morrer sozinho do que matar a dois...
-"Entregue-me ao destino, não poderei odiar se estiver sozinho..."
Do outro lado, lágrimas e mais silêncio, talvez a face da inocência pensasse que o monstro tomara face, mas era essa a face de um monstro?
Um beijo doce...
-"Eu não mereço ter você"
...

O piscar dos olhos o trouxe a realidade novamente, percebera que nunca mais conseguiu esboçar um sorriso desde então, a dor já não era mais brincadeira... era tarde e estava cansado, e se pudesse mudar, esparava nunca descobrir...
A chuva abrandara e seus demônios o deixavam descansar, mais um cigarro, mais uma tragada... a sua frente, uma penteadeira:
"Ainda pressiono suas cartas contra meus lábios" - pensava o o homem, deixando-se levar pelo doce gosto dos sentimentos. Guardou tais sentimentos em partes de si que até ele se esquecia, partes que ainda guardavam os gostos de cada beijo. O cigarro ia se acabando e a verdade vinha atormenta-lo "Não posso aguentar a vida sem sua luz!".... um trovão, a verdade, a raiva, a dor e os demônios: "Mas tudo isso foi arrancado de mim quando você se recusou a lutar!"

Ela deveria estar a chegar a qualquer momento, ele servia-se, trêmulo, de um copo de conhaque, mas os pensamentos não iam embora, tudo que pensava em dizer a ela todos esses anos era varrido com raiva pelo monstro, o animal soltara-se novamente e imaginava novos discursos para o anjo que chegaria logo:
"Então nem gaste seu tempo, não irei escutar. Acho que já me fiz claro demais. Você não pode odiar o suficiente para amar. Será que isso basta?"
Ele estava cansado, já não tinha alma e era tarde, acendia outro cigarro, servia-se de mais um gole, mas seus demônios não queriam calar-se: "Eu só queria que você não fosse minha amiga, pois então poderia machucar-lhe no final." as lágrimas caiam pelos olhos, a imagem deturpada em sua mente ficava mais forte, jogara o copo contra a parede, não queria mais nada, abraçara o animal que era e percebeu que aquilo era a única coisa real que tinha, ele nunca clamara ser nenhum anjo, já era tarde, sabia o que tinha sacrificado para ela poder se manter viva, já não tinha mais nada além de seus demônios, percorria um lado e outro do quato, gritando o que diria quando ela o visse: "Então arrebente-se contra minhas pedras! E cuspa sua piedade em minha alma! Você nunca precisou de nenhuma ajuda!"
Arremessou as cartas pela janela, o telefone ao chão.
-"Você me vendeu para se salvar! Eu não ouvirei suas desculpas! Você fugiu... você fugiu! Anjos mentem para manter o controle!"
O olhar vermelho, o quarto despedaçado, era só mais uma sombra naquele quarto, mais uma alma despedaçada, era mártir de sua própria existência, e com os olhos mareados, sentou-se no canto do quarto, acendendo outro cigarro. Então ouviu a porta.... um trovão, uma batida na porta, ficou apenas com o beijo doce de outrora, deu mais uma tragada no cigarro e ouviu baterem na porta até o barulho cessar, falando baixo, enquanto tragava seu cigarro - "Se você ainda se importa, nunca me deixe saber" Um homem, e um cigarro. Uma sombra... ninguém... -"Se você ainda se importa, nunca me deixe saber..."

A Menina da Caixa de Sapatos

00:24 / Postado por Figgis / comentários (0)

Ela surgiu no meio da noite paranóica. Paranóia pragmática, psicotóprica e abusada, não sorriu nem disse nada, nem se irritou nem deu risada.A garota da caixa... me disse que vivia numa caixa de sapatos. Não tinha rosto não tinha nada, não tinha vida não tinha nada, não tinha idéia da sensação causada. Empatia, ligação, sem compromisso, com vibração... não tinha nada. Tinha nada... tinha nada, o nada que a menina tinha era o nada que me seguia, a menina do sapato... do cuturno, do vinil e da caixa.Não tinha olhos, não cria em Deus, criava vida e me dizia adeus.... voltara para a caixa.
Todos os dias, o dia todo, dormia em sua caixa, toda a noite, a noite toda, saia e brincava. Brincava alegre sem estar feliz, brincava para afastar a dor do vazio, o mesmo vazio que me seguia... e então a menina da caixa ganhou vida.
Dizia aos risos que chorara, dizia em baixos gritos que não tinha nada, que vivia sozinha em sua caixa.
A menina da caixa dos sapatos não tinha nada que eu não quisesse, não tinha nada que eu queria, não tinha nada e eu queria, nada ter, mas era tarde... a menina do sapato tinha ido até a margem e deu um passo a mais. A mais sisuda, a mais igual, a mais diferente, mas nada mal.
Ela lutava com moinhos de vento, estava na guerra e não era guerreira, lutava com seus demônios usando escudos, e ganhava sem atacar. E então ganhou rosto... a menina do sapato tinha vida tinha rosto... dizia que não tinha nada, mas tinha algo de especial... nada ter, mas era tarde... era tarde e me disse adeus... boa noite, na caixa de sapatos...
A menina era garota... com rosto corpo e vida, e do seu mundo veio a mim, e não consegui não olhar. Garota linda, mas desavisada, garota gata, mas escaldada, garota viva e iluminada.
Desavisaram-lhe de sua beleza, e assim vinha e me falava, que era comum e não tinha nada, e de comum não tinha nada, e comum não era nada, nada ter mas era tarde, mentiu pra mim dizendo que eu era bonito e menti a ela dizendo que não acreditava e me perdi em ambas mentiras...
Gata escaldada, mas era gata, mas se dizia, não tinha nada. Não sei da onde veio ou pra onde ia, além da caixa de sapatos, não se escaldaram-na ou se escaldou-se, mas dizia, não tinha nada... e se eu dizia voltava a caixa, então menti não dizendo nada, e me perdi em amplas mentiras.
Dizia que sua luz vinha da lâmpada... não cria em Deus, não cria em nada, se lhe falava dava risadas. Ria de mim e comigo, e me disse que somos a mesma pessoa. Comi uma bolacha e ela disse que lhe fez mal, ela ficou triste e eu dormi mal...Será que somos a mesma pessoa? Essa noite eu suspirei por ela.... mas ela não tinha nada, e voltei para minha caixa de sapatos...

O Cult Vende

03:34 / Postado por Figgis / comentários (0)

O cult vende... o cult vende...
Ele era um garoto alternativo, um ser humano único e diferente, não se encaixava na sociedade, gostava de ouvir músicas que ninguem ouvia, via filmes que ninguem via... ele tinha um gosto totalmente alternativo! Ele não se excluia das pessoas porque queria, elas que o excluiam, coitado do alternativo... não tinha amigos... não tinha alternativas.
Um dia o alternativo encontrou seus amiguinhos, todos alternativos, todos ouviam as mesmas músicas que ele, se vestiam igual a ele, eles todos eram alternativos!
Ele e sua turminha de alternativos vestiam-se diferentes, eram todos únicos e especiais... todos ouviam músicas que ninguem mais ouvia, todos viam filmes cult, que os outros diziam que eram ruins, eles entendiam do assunto, eram os reis do alternativo, ninguem era mais alternativo que eles!
Ele nunca sentira-se tão bem, percebia que não era o único injustiçado no mundo, que não era o único que sofria preconceitos da sociedade, ele e sua turminha de alternativos se encontravam todo dia para dizer como foram injustiçados.
Um dia ele ouviu uma música legal no rádio, e foi contar para seus amiguinhos, mas seus amiguinhos riram dele, aquela música era mainstream, era comercial, o cantor era um vendido, aquela música não era boa para eles... eles eram alternativos!
Eles eram alternativos.... todos se vestiam iguais, com a moda alternativa... todos ouviam as mesmas músicas, músicas alternativas, todos viam os mesmos filmes, os filmes cult... todos se sentiam injustiçados pelo mundo, mas no silêncio das almas sabiam que eram melhores... eram especiais, únicos... eram todos únicos, não tinha hierarquia, eram todos únicos iguais...
Ele deu um passo para trás, viu seus coleguinhas falando mal do mundo, de como era difícil ser diferente, de como a era moderna não dá valor à arte, aos grandes pensadores. Ao perguntar quais eram seus livros preferidos, algum deles respondeu de pronto - "Para Além do Bem e do Mal" - outro dizia sem pestanejar - "O Vermelho e o Negro, de Stendhal!" - e deveriam ver a felicidade estampada no rosto deste, ao perceber que sua resposta foi a mais única e especial. Todos os amiguinhos olharam para ele, admiraram-no, e embora perguntassem do que se tratava o livro, ele apenas dava respostas vagas e fingia uma falsa modéstia. Em seguida, quando ele se virou para outro rapaz, o mesmo não respondeu, mas ao invés disso preferiu desferir balbúridas sobre O Código Da Vinci, dizia detalhadamente cada parte do livro que não havia gostado, e de como o Dan Brown era um vendido....
Ele fez a mesma coisa, perguntando sobre filmes, sobre música, todos respondiam a mesma coisa, nem pensavam, enumeravam uma lista infindável e disputavam entre si quem gostava do cineasta mais diferente, ouvia-se "Fellini" de um lado, "Orson Welles" do outro, e quando alguem disse "Godart" todos extasiaram-se, todos concordaram, balançavam a cabeça afirmativamente e citavam algum fato sobre ele, Godart foi a palavra de ordem da discussão... todos gostavam de Godart, Godart era o melhor!
Eles eram diferentes, eles eram alternativos, eles comiam Dan Brown e vomitavam Stendhal, eles achavam que seus gostos eram especiais e únicos e se achavam diferentes de todos os outros, eles se vestiam com roupas alternativas porque não aceitavam ser discriminados pelo que gostam, mas aquele que não se vestisse diferente, igual a eles, era excluido rapidamente. Eles gostavam de filmes cult, só eles tinham aqueles filmes, eram especiais, diferentes e alternativos.... todos eles tinham... só eles... o cult vende... o cult vende....
Ele deu um passo para trás, vestiu o que queria, ouviu o que gostava, não ligando se era mainstream ou underground, via o que queria e percebeu que era diferente e único por isso. Ele percebeu outras duas coisas: Está na moda ser alternativo, e... o cult... vende...