Madrugada Vermelha - Parte 3

17:13 / Postado por Figgis /

Abalado

A garoa sempre fina da metrópole sem nome caía. Caía na grande avenida deserta, caía na pequena rua estranha que a cruzava cheia de bares alternativos e boates underground e caía na porta da Sodoma moderna, o “Le Rouge”.
Os pingos matavam a sede do asfalto calorento, acalorado, que era pisoteado dia e noite e agora se aprazia evaporando os pequenos grãos de água que lhe era proporcionado.
O vento da chuva fazia questão de arrastar por dentre as frestas do Le Rouge essa brisa vaporífera que se misturava ao gelo seco e dançava sensual com os corpos pingantes de suor que se esbaldavam daquele velado ritual de acasalamento.
Homens e mulheres em transe de transa, alinhando verticalmente seus desejos horizontais. Os corpos se tocam, os olhos se engolem, os sorrisos atiram.
Encostado no balcão, Daniel apenas assiste a tudo, com o copo de caipirinha na mão, esperando que o álcool lhe traga a coragem que serve de convite nesse tipo de festa. A outra mão sai do bolso da calça jeans com o celular de última geração e com um toque liga a luz que revela a hora. Duas horas...

- Ei Daniel, vem dançar, desde que começou a namorar fica sempre pelos cantos amuado. Aproveita que hoje a a Rê não tá contigo e vem dançar comigo. - dizia a loira e lesa Lívia, com a mão sobre a dele rebolando o quadril avantajado que Deus e o Diabo lhe deram como arma de conquista.

Deveras a Rê, a Renata, namorada de Daniel não estava lá. E também é verdade que depois do começo do namoro ele vivia pelos cantos. Ambas afirmações tão verdadeiras quanto àquelas que não se diz, como o fato de Renata estar em casa, dormindo abraçada ao ursinho, sem saber que Daniel foi pra balada, ou que consome com o olhar a loira fácil que não desprendeu-se, dele um minuto.
Muita bebida pra pouco homem, ele se levanta torto e ensaia um gingado cuidadoso para que o líquido não lhe fuja do estômago.
Lívia se esfrega, se enrosca no Mauricinho com pinta de Ricardão, o pobre, podre Daniel.
Não, não dá, o álcool não lhe comrpou um ingresso para o ritual de acasalamento, mas a lesa Lívia não se importa:

- Vem, vamos sair daqui, tá muito quente, vamos pra um lugar mais sossegado, Dan.

Dan... iel cala e consente, puxado pelas mãos iria até pro inferno se ela o levasse, e levará...
Trocando risadas com a mesma proporção que trocam as pernas, lá vão Lívia e Daniel rua afora, pela rua estranha até a grande avenida. Encostado na porta do carro, um compacto de última geração, Daniel tenta pensar no que está acontecendo enquanto Lívia o estupra sem sentimentos e com todo consentimento. Beijos, línguas e mãos sob os olhos da garoa que evapora no corpo dos amantes.
Daniel alcança as chaves do carro, imperfeitas condições para dirigir pra qualquer lugar pra ser comido por Lívia, mas há outro homem sob o olhar conivente da chuvinha.

- Aí cuzão, se abrir a boca tú morre, seu viado. Passa as chaves, vai, vai...

Lívia se afasta e cai, tropeçando no meio-fio. Daniel ainda se perguntando cadê a boca que massageia a sua sente as chaves sendo puxadas de sua mão. Ele nem reage.
O homem age. Dois tiros em Daniel, um no peito e outro na garganta.
Dan de olhos abertos vê Lí, melhor amiga de Rê, fugir dali.
O homem arranca o carro da rua na mesma velocidade que arrancou Daniel do mundo.
No chão, a garoa cinza esquenta o corpo do que era Daniel, que está friorento, resfriado... rodeado pelo sangue písado que é da cor do céu daquela noite...

- Rê...

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