Eu Não Sei do Que Posso Te Salvar

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As batidinhas ansiosas dos meus pés. Vou escutar o Ipod... ah! Não fode! Tá quebrado! Está frio, afundo as mãos dentro da manga do suéter listrado de flanela. Esse Sol de domingo de manhã é estranho por que hoje é terça. Recolho-me no sofá da minha sala e presto atenção nas batidinhas dos meus pés enquanto espero ela chegar.

Faz três anos desde a última vez que nos falamos, foi engraçado, vou contar pra vocês, foi assim...

Lá estava eu, subindo as escadas rolantes do shopping, distraído, olhando vitrines, quando dei por mim, estava ela ali, em cima de mim! A menina, a minha menina, estava um degrau a minha frente, como sempre, e olhava pra mim com seus olhos de mangá, seus olhos cintilantes de Betty Boop, sobretudo vermelho e um sorriso que deve ter comprado lá mesmo no shopping, ninguém nasce com aquele sorriso! Meu primeiro impulso foi abraça-la como uma criança se aninha no peito de uma mãe, sempre fazíamos isso na época em que eu era feliz. A escada chegou ao fim sem que um segundo se passasse, quase trombei nela e quando ela andou pra trás, se afastando de mim, achei que fosse fugir e dei um passo à frente. Rimos em velado, velados sobre o véu do estranhamento.

Essa foi a última vez que nos falamos. O que falamos? Nem me lembro, nem importa. Nos falamos...

Eu não sou dado a amigos, faço mais o tipo que tem colegas, e deve ser por isso que não costumo reencontrar pessoas depois de anos, aquilo que passa vai, se esvai, mas ela me ligou ontem e já tinha passado da meia-noite. Eu estava no meu quarto, dedilhando no violão algum british pop, faço isso às vezes só pra manter distante o silêncio de quem mora sozinho. Às vezes conto piadas pra mim mesmo e rio delas, às vezes escrevo nas paredes, às vezes choro e outras vezes faço chá, mas naquela noite, recebi um telefonema! Minha pequena pequena, minha pequena Amelie Poulain... ela encontra refúgio no não-convencional, subterfúgio no artificial. Ela invade festas de criança só pra poder dançar, corta o cabelo de acordo com as estações do ano, brinca de tirar fotos e já ganhou até prêmio, premiada por brincar, quem diria, que menina!

Ela vivia achando dinheiro na rua, dizia que essa seria sua nova profissão. E poderia tê-la seguido se quisesse, sério mesmo! Achava sempre notas gordas, de cinquenta ou até de cem! Deve ser porque ela realmente olhava em volta... é a única pessoa que eu conheci que realmente via beleza numa flor. Ai, as batidinhas do meu pé!

Quando atendi ao telefone ela me perguntou se eu tinha visto algum filme bom recentemente, e depois disso nos perguntamos tudo, menos as coisas que não importam como: “Como vai você?” ou “O que tem feito?”. Eu cochilei por dez minutos e ela ficou no telefone, disse que queria ouvir minha respiração engraçada, e depois rimos disso assim como rimos dos ornitorrincos e do Joaquim Phoenix ter virado rapper... rimos até o Sol nascer e agora ela está vindo pra cá!

Me esforço pra lembrar seu rosto, suas feições, mas não consigo. Sei que ela tem olhos de mangá e nariz de borboleta, mas não é que a Beleza é mesmo coisa interior, já não me lembro de beleza a não ser no ser daquele ser, mas sei que era bela, quase uma Bella, mistura da Swan e do Lugosi, e belas e feras só ficam juntos em desenhos animados, coisa que não me anima nem um pouco. Me faz lembrar da frase que dissemos ao final: Eu não sei do que posso te salvar. “Eu não sei do que posso te salvar” disse o outro ao um.

Ouço a campainha, droga, eu ainda tô com o suéter de dormir, calça de pano, cadê meu Ipod pra fingir que sou descolado? Ah é, ta quebrado. Arrumo o emaranhado que chamo de cabelo, pelo menos os dentes eu escovei. Fui olhar pela janela do lado da porta da cozinha e volto a vê-la, está parada no portão. Apenas um gramado sem flores separa a gente agora, meus pés pararam de bater, o que é isso batendo agora? Ok. Lá vou eu. Abro a porta, ela abre o portão. Cabelo curto, meio preto meio tudo, que delícia! Ha-ha-ha, é claro que ela não segue a linha e vai por cima da grama. Sandália rasa, saia jeans e camisa do Libertines, menos de meia hora do telefone até aqui e vestida pra me matar.

- Entra! – droga, deveria ter sido um “Bom dia, há quanto tempo” ou ainda um atrevido “Você está linda! Adorei o que fez com o cabelo”.

Olha! Ela me olha! Invadiu os meus domínios, tá com os dois pés na minha cozinha, parada, bem aqui na minha frente! Ela está bem aqui, na minha frente, nesse exato momento, enquanto em um universo paralelo escrevo isso pra vocês! É exatamente como eu me lembrava (embora eu não lembrasse), só falta o sorriso, os olhos cintilantes, o brilho da manhã... bem, ela não está exatamente como eu me lembrava, mas que se foda, eu nem lembrava direito dela mesmo. O quê? O que é isso?

- Estou com problemas! Droga... mal cheguei e já estou me abrindo! Eu jurei que ia manter a pose! – O que é isso nos olhos dela? Lágrimas? Nunca as vi ali! Ela sorri sem graça, fazendo pose de princesa por um instante antes de se sentar. – Eu sei que você não tem nada a ver com isso, mas tudo desabou... o amor, o dinheiro, a família. Até a exposição que eu ia fazer cancelaram...

Quem é essa mulher? E o que ela fez com a minha menina? Problemas? Achei que só eu os tinha! Ela está despedaçando minhas fantasias! O que eu vou fazer com isso? Droga, eu deveria falar alguma coisa, essa desconhecida está falando de problemas conjugais e nem ao menos está sorrindo. Achei que só eu os tinha.

- V-você está bem? – Parabéns pra mim, acabo de arrancar uma risada engasgada sendo um completo idiota! – Digo... o que eu posso fazer? Eu adoraria te ajudar, mas eu não sei do que te salvar...

Caminho e sento no banco ao lado do dela enquanto nos olhamos. É, eu falei isso sem querer, mas ela lembrou da onde essa frase veio. Parece que bateu como uma rocha, não foi minha intenção. A vingança é um prato que se come frio, o problema é que eu não gosto de comida fria. Tenho estado a tanto tempo sozinho, endureci. Nessa minha vida sozinha aprendi a toca violão, a contar piadas pra mim mesmo. Às vezes choro e às vezes faço chá. Eu não te reconheço mais, mas essa pessoa que vejo na minha frente tem problemas que nem eu e essa pessoa é que eu quero conhecer.

- Calma, respira. Vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem agora. Você aceita um chá?

Às vezes eu choro, outras vezes faço chá... hoje não estou no clima pra chorar, talvez num universo paralelo, mas enquanto penso todas essas coisas pego a chaleira e ponho a água pra ferver. Caminho até a porta e a fecho, deixando pra fora todo o resto, todas as outras vidas que deixo de viver.

A porta se fecha lentamente deixando tudo que não importa mais pra fora, inclusive vocês!

Sobre Vidas IV

16:54 / Postado por Figgis / comentários (0)

Meu cérebro está funcionando em uma frequência estranha, acelerada, parece que o mundo não funciona da forma certa. Parece que tenho a resposta para todas as perguntas, sendo que ninguém me perguntou nada. Meu cérebro pulsa, dispara, como um coração ou uma arma.

Hoje eu tô a fim de exercitar o órgão mais importante do meu corpo, leva-lo para cima e para baixo em pegadas compulsórias, quero movimentar meu cérebro e achar essas perguntas escondidas no viés da minha história.

Quero nascer, nascer e nascer pra enfim viver, sentir e morrer. Quero um mundo na frequência certa, que pulse como pulsa minha mente mensalista, que dispare como se dispara rumo ao novo e ao nada. Tô a fim de um pouco de masturbação mental, um vinho com Almodóvar ou um queijo e Gardel, um manifesto comunista e um gole de bebida.

Hoje, meu cérebro funciona em uma frequência diferente, porém frequente. Faz com que eu sinta frio em noite quente e por isso quero um alívio qualquer, um whisky e um Baudelaire, e assim masturbar a minha mente, quem sabe assim você me sente.

Sobre Vidas III

16:51 / Postado por Figgis / comentários (0)

Mas será que se apagou toda a faísca de um tempo bom? Um tempo de amor inocente, tão simples e aparente. Já morreu meio morto? Já viveu outra vida? Viveu vida que em nossa vida morreu... será que lembra que ainda me lembro dela?

De tantos anos, deve ter sufocado, supus secado, mas será que seguiu-se sossegado? Pronto pra ser sugado novamente por nossas sangrias.. ai tais dias!

Ai aquele dia, foi tão lindo de te admirar, foi admirável nosso amor de luz, a luz já se apagou?

Quero de novo teus suspiros, com gosto de suspiro, de baunilha... tão inocente e aparente, as nossas simples mentes... ai que amor, porque se foi? Vem ser bom de novo ou traz outro igual atrás do normal banal de hoje em dia, em dia, em dia.

Ai não quero mais me lembrar, já não quero te lembrar.. não se lembre, mas se lembrar! Ah, se lembrar... vai se lembrar? Ah, mas se amar... almas ao mar...

Demonstrava Alegria

19:01 / Postado por Figgis / comentários (0)

Demonstrava alegria, quem diria!
Era só mais um ato, o seu pulo do gato,
Uma peça doentia
Quem diria...

Demonstrava alegria, quem diria!
Era só dar um trato, tingir o retrato,
Uma vista vazia
Quem diria...

Lá onde todas nasciam, nascia Maria
Servindo sentada, sorria sangrada
Sua triste alegria.

E quando o tempo passou, passava Maria
Donzela intocada, cadela currada
Dupla sinfonia... quem diria!

Às vezes o céu disfarça
Às vezes o Sol desaba
De céu estrelado a choro estralado
Ninguém nota Maria... quem diria!

Demonstrava alegria, uma falsa alegria
Demonstrava alegria, maldita poesia
Demonstrava alegria, agourada agonia

Às vezes o céu desaba
Às vezes o Sol dispara
Às vezes Deus olha pra ela e diz: “Pára Maria”

Quem diria... foi fim da melodia...
Uma triste agonia... quem diria,
Quem diria... demonstrava alegria!

Sobre Lentes

18:59 / Postado por Figgis / comentários (0)

Escrevo estas palavras enrolado num cobertor, com um cigarro na mão e uma caneca de café quente. Ah sim, chove lá fora e já é noite...

O dia de ontem passou, eu nem vi. Muitos dias de ontem já passaram. Foram-se os nove, dez e quinze da minha existência e como uma locomotiva que se impulsiona, foram muito mais que isso em velocidade estelar.

Quando paro para pensar, chego a conclusão que vivi poucos dias da minha vida, já que na sua maioria eles são apenas uma sucessão de ontens que não vi passar.

Acendo outro cigarro, mexo nas pastas de imagem do meu computador. Fotos antigas.

Nossa como os dias são ensolarados... imagens saturadas, sorrisos ampliados, pontos fixos pra onde eu olho e enxergo na pequena o reflexo da sobriedade. As fotos de hoje estão tão sombrias, tortas... minha galera está sempre reunida num bar, ou bêbada em alguma calçada... sempre a noite, mesmo quando é dia, meio escuro, meio tudo e nada... sei lá... imagens tortas... sorrisos tortos... pessoas tortas...

Acho que os tempos mudaram e não estou tão certo que para melhor, não sei se a evolução da coca-cola pra cerveja faz parte de um processo de ascensão ou declínio, mas sei que hoje já não declino muitas coisas que não fazem parte de mim.

Naquela foto, tudo claro e nítido, nesta tudo perdido num mar de sombras, um cigarro na mão que nem esse que seguro agora. Já não sei se seguro essa...

Fotos, reflexos dos tempos que não vi passar, do ontem, hoje e sempre. Vivemos em tempos caóticos sem sabores exóticos, sem sentidos católicos, sem motrizes eólicas, sem pontos fixos.

Fotos, reflexo dos dias que não vi passar, e que passam, ainda assim.

E agora? Modifico minha busca, minhas lentes, meus desprazeres... procuro paz? Ou calo minha boca com outra dose de cachaça azeda num copo de plástico?

Acho que vou decidir isso com uma com mel e limão pra entortar minha visão...

Futura Nação

18:55 / Postado por Figgis / comentários (0)

Somos o futuro da sua nação

Estamos bebendo todo o seu mundo

Desaprendemos suas lições

Regurgitamos seus delitos

Estamos brincando no seu quintal

Somos cabras-cegas dos seus estudos

Desconhecemos seus conhecimentos

Cometemos suicídio com suas armas

Vendemos o que não tinha preço

Compramos o que não tinha nada

Desconfiamos de suas certezas

Nos contentamos com seus tropeços

Sua nação agora é nossa

Seu mundo agora é nosso

Suas lições, conhecimentos, certezas

Viraram delitos, armas e tropeços

Nação cabra-cega

Comprados, vendidos

Suicidas contentes

Somos seu mundo-quintal

13:59 / Postado por Figgis / comentários (0)

Serei sombra sobrada de um Sol sem som?
Um sobrado sombrio de um ser sóbrio sofrido?
Serei sombra? Serei sóbrio?

Serei só se ser sobra?
É que às vezes o ser sobra.
Só, sobra a sombra do ser-sobra.

Serei sentido sentado de um sorriso solado?
Sombra sem Sol, um sem-sentido sensato?
Sentir sem ter, sentar. Serei sorriso ou solado?

Um ser que sente ou que senta?
Ser separado? Serei ser parado?
Serei ser ou serei sobra?

Serei sombra...

Pagliaccio

13:58 / Postado por Figgis / comentários (0)

Nessa noite só os malditos cantam. Esta é a noite em que cantam os malditos...

-Me lembro daquele musical antigo... aquele do Gene Kelly, famoso, como era mesmo o nome?

-Cantando na Chuva.

-Isso, Cantando na Chuva, isso. É que eu não estava lembrando da cena da chuva. Me lembro de uma cena com Donald O’Connor, aquele velho com cara de criança. Era uma música que dizia que devíamos fazer rir.

-Ninguém está rindo aqui...

-Exatamente. Ninguém está rindo! Sempre achei que aquela música tinha um tom irônico, sabe... ela dizia para fazer os outros rirem, mas sempre achei o Donald O’Connor meio tristonho. Acho que ele é como eu, uma alma perdida dentro de seu personagem. Donald era um palhaço, uma caricatura do homem, que tinha como função fazer os outros rirem, porém tinha aqueles olhos tristes... entende o que eu quero dizer?

-Desculpe... não entendo... porque está me prendendo aqui? Isso era pra ser alguma piada?

-Não, droga. Você perdeu o sentido! O único motivo de você estar aqui é porque eu cansei de contar a piada... cansei de refletir essa maldita sociedade! Ela perdeu a graça pra mim. Você perdeu a graça pra mim...

-Eu... eu... desculpa.

-Você me disse que já viu tudo. Já viveu tudo. Mas você já viu o Mal? O mal como um fim e não como um meio. Sabe, eu já estive por aí... eu já caminhei por essa maldita cidade, visitei cada esgoto e cada bueiro e senti o cheiro da merda que você finge que conhece. Eu sou o fim da piada que ninguém ri, sou o sorriso contido da mulher infiel. Eu sou a lágrima que escorre do olho do palhaço quando as cortinas se fecham!

-Pare, eu não sei o que quer que eu faça...

-Quero que olhe pra mim. Quero que olhe bem no fundo dos meus olhos! Você fala da dor com propriedade. Fala do ódio com o dom da tristeza que não te pertence. Fala das nuvens pretas no seu arco-íris colorido. Vou te dar um pouco da dor e do ódio. Quero vomitar no seu arco-íris!

-Não! Por favor! Pare!!!

-Tenho um segredo pra te contar, pequeno botão-de-rosa: Eu caminhei pelos vales da sombra da morte, e adivinha! Não tinha ninguém lá!

...

-Pra quem se odeia tanto, você pareceu se amar demais. Posso agora voltar ao meu personagem e manter minha tristeza dentro dos meus olhos. Ridi, pagliaccio, ridi...

Estrangeiro

13:56 / Postado por Figgis / comentários (0)

Aqui tudo acontece! Chegamos ao ponto em que tudo acontece, baby.
Aqui as flores voam, os pássaros sussurram, as sirenes abusam e os semáforos ricocheteiam. Aqui tudo acontece baby.
Cidade estranha, sinais estranhos, aqui é tudo, tudo, tudo... tudo acontece.
Vivemos de amores estáticos, valores estrábicos, sentidos retornáveis, amigos recicláveis. Estamos lentos demais para esta cidade... corre, corre, corre.
Corre, baby!

Agora tudo apodrece. É, é! Tudo! Tudo apodrece!
Já não voamos mais, cadê os pássaros, ouço passos! Sussurros, sirenes, semáforos!
Tudo apodrece, baby... perde o sentido.
Amores fleumáticos... amores reumáticos...
Cidade maldita, tu engole ou gospe, maldita?
Morre, baby!

Aqui, agora. Aqui, agora...
Das flores e os pássaros às sirenes e os semáforos.
Valores sintáticos.
Baby, baby, baby.
Tu és esta maldita cidade estranha.
Tudo é esta estranha cidade maldita.

Sorriso, Nada Mais

13:54 / Postado por Figgis / comentários (0)

Sorria, sorria... isso, eu sei que você consegue.
Continue sorrindo, olhe a sua volta, isso, olhe em volta e sorria.
Vamos lá... um sorriso... assim, assim... um sorriso e nada mais.
Nada, mas um sorriso, mais um sorriso, um sorriso-nada.
Sorria, é isso aí.
Eu sei que você consegue sorrir esse seu sorriso-nada.