Snuff

16:31 / Postado por Figgis /

(inspirado em uma inspiração real, respirado em "Snuff", nova música do grupo musical Slipknot, suspirado em uma personagem fictícia...)

Já era tarde da noite, mais uma madrugada sufocante, dentro do apartamento as sombras se fundiam com a imagem daquele homem, sentado numa velha poltrona bege, com a cabeça baixa, o rosto escondido em meio aos cabelos longos que caiam no seu rosto e tudo que era visível no ambiente era a fumaça do cigarro que flutuava lentamente, carregando seus demônios para longe, já era tarde e estava cansado.
Não tinha nome, não precisava de um, era apenas mais uma sombra do quarto, mais uma imagem no mundo que só existe como forma de uma luz que não resplandia em si. Calças amassadas, camiseta preta... era só um homem e um cigarro, olhando para a penteadeira a sua frente. Um telefone, várias cartas... uma penteadeira.
A chuva forte que caía lá fora inibia o som dos seus pensamentos, flashbacks delirantes, ouvia sua voz em um passado que parecia tão longe, que já não existia mais... no passado. O dia que perdeu sua alma, o resto de alma que tinha, já não conseguia lembrar o que era real e o que era sua imaginação sádica... ouviu sua própria voz, falando calmo com o vulto de esperanças - "Enterre seus segredos em minha pele" - o rosto que toda noite o atormentava já era uma imagem desfigurada que o inconsciente fez questão de deturpar - "Leve embora sua inocência e me deixe os pecados...". Mártir de sua própria existência... já era tarde e estava cansado.
Tragada sufocante, absorvera todo o veneno que sentia necessidade de inalar. Não sabia se era viciado na nicotina, no veneno do rato ou na dependência de algo em suas mãos, e não ligava de morrer aos poucos... a fumaça a sua volta representava a jaula que o mantinha preso, animal sem alma e sem destino. Cerrou o punho e bateu contra o braço da poltrona, apertava a mandíbula uma contra a outra e se levantava, indo até a janela... não entendia seus sentimentos, o amor era só mais uma camuflagem para o ódio, que voltava subitamente.

Um trovão! O som do trovão! Mais uma madrugada sufocante disfarçada de noite comum, já tinha tido uma dessas, pensava no telefone que tocou poucos minutos antes, ouvindo a voz da flor da inocência -"Quero ver-te novamente" E toda a dor vindo a tona.

Um trovão! O som do trovão! Perdido no meio da chuva, a água escorrendo no seu rosto. Quantos anos atrás não se sabe... um doce beijo.... uma doce raiva... a dor ainda era uma brincadeira, era uma madrugada chuvosa disfarçada de noite comum, e não sabia que seu crime teria tal castigo:
-"Então, se me ama, deixe-me ir! E vá embora antes que eu perceba!"
O silêncio do outro lado... o silêncio da compaixão
-"Meu coração é sombrio demais para que se importe." - continuara -"Não poderei destruir o que não existe!"
Mártir de si mesmo, melhor morrer sozinho do que matar a dois...
-"Entregue-me ao destino, não poderei odiar se estiver sozinho..."
Do outro lado, lágrimas e mais silêncio, talvez a face da inocência pensasse que o monstro tomara face, mas era essa a face de um monstro?
Um beijo doce...
-"Eu não mereço ter você"
...

O piscar dos olhos o trouxe a realidade novamente, percebera que nunca mais conseguiu esboçar um sorriso desde então, a dor já não era mais brincadeira... era tarde e estava cansado, e se pudesse mudar, esparava nunca descobrir...
A chuva abrandara e seus demônios o deixavam descansar, mais um cigarro, mais uma tragada... a sua frente, uma penteadeira:
"Ainda pressiono suas cartas contra meus lábios" - pensava o o homem, deixando-se levar pelo doce gosto dos sentimentos. Guardou tais sentimentos em partes de si que até ele se esquecia, partes que ainda guardavam os gostos de cada beijo. O cigarro ia se acabando e a verdade vinha atormenta-lo "Não posso aguentar a vida sem sua luz!".... um trovão, a verdade, a raiva, a dor e os demônios: "Mas tudo isso foi arrancado de mim quando você se recusou a lutar!"

Ela deveria estar a chegar a qualquer momento, ele servia-se, trêmulo, de um copo de conhaque, mas os pensamentos não iam embora, tudo que pensava em dizer a ela todos esses anos era varrido com raiva pelo monstro, o animal soltara-se novamente e imaginava novos discursos para o anjo que chegaria logo:
"Então nem gaste seu tempo, não irei escutar. Acho que já me fiz claro demais. Você não pode odiar o suficiente para amar. Será que isso basta?"
Ele estava cansado, já não tinha alma e era tarde, acendia outro cigarro, servia-se de mais um gole, mas seus demônios não queriam calar-se: "Eu só queria que você não fosse minha amiga, pois então poderia machucar-lhe no final." as lágrimas caiam pelos olhos, a imagem deturpada em sua mente ficava mais forte, jogara o copo contra a parede, não queria mais nada, abraçara o animal que era e percebeu que aquilo era a única coisa real que tinha, ele nunca clamara ser nenhum anjo, já era tarde, sabia o que tinha sacrificado para ela poder se manter viva, já não tinha mais nada além de seus demônios, percorria um lado e outro do quato, gritando o que diria quando ela o visse: "Então arrebente-se contra minhas pedras! E cuspa sua piedade em minha alma! Você nunca precisou de nenhuma ajuda!"
Arremessou as cartas pela janela, o telefone ao chão.
-"Você me vendeu para se salvar! Eu não ouvirei suas desculpas! Você fugiu... você fugiu! Anjos mentem para manter o controle!"
O olhar vermelho, o quarto despedaçado, era só mais uma sombra naquele quarto, mais uma alma despedaçada, era mártir de sua própria existência, e com os olhos mareados, sentou-se no canto do quarto, acendendo outro cigarro. Então ouviu a porta.... um trovão, uma batida na porta, ficou apenas com o beijo doce de outrora, deu mais uma tragada no cigarro e ouviu baterem na porta até o barulho cessar, falando baixo, enquanto tragava seu cigarro - "Se você ainda se importa, nunca me deixe saber" Um homem, e um cigarro. Uma sombra... ninguém... -"Se você ainda se importa, nunca me deixe saber..."

1 comentários:

Anônimo on terça-feira, outubro 14, 2008

ha!
Perfeita simbiose entre música e texto...

mto mto mto bom!


Parabéns!

^^

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